25/05/2023
A Associação de Circo do Rio Grande do Sul e o Sated vêm, através desta carta aberta, manifestar publicamente o seu apoio ao artista Julio Abraham Ponce que atua há mais de 20 anos fazendo a estátua viva “Anjo” nas ruas e praças públicas de Porto Alegre. Percebemos que se faz urgente uma reparação digna ao artista, assim como também a conscientização de comerciantes e cidadãos a respeito das leis que garantem a legitimidade da arte de rua nos territórios públicos. Por nosso compromisso com a classe artística, repudiamos quaisquer atitudes que venham ferir a liberdade do artista de atuar em tais espaços, ainda que estes se tornem concessões a gerenciamentos da iniciativa privada.
Sobre o caso: no dia 29 de abril, no trecho 1 da orla do Guaíba, o artista foi interpelado de forma brusca por um funcionário da GAM3, empresa que recebeu a concessão de gerenciar por 35 anos a área em 2020. O funcionário, numa abordagem insistente, cobrou um alvará com autorização para o artista se apresentar no local e ameaçou chamar a Brigada Militar caso ele não se retirasse.
Essa abordagem desrespeita a Lei Municipal do Artista de Rua, Lei 12.821/21, que trata de apresentações em locais públicos de Porto Alegre sem a exigência de qualquer autorização prévia, como alvará.
O fato ganhou grande repercussão nas redes sociais. A partir disso, vários órgãos estão se mobilizando: a Associação de Circo escutou o artista e vem acompanhando os desdobramentos e se comprometeu a escrever esta carta-manifesto, o SATED-RS está prestando acompanhamento com o seu setor jurídico, o Conselho Municipal de Cultura de Porto Alegre (CMC), o Conselho Estadual de Cultura (CEC), e a Câmara dos Deputados também se fizeram presentes na escuta e no apoio ao artista. O artista contou que muitas pessoas estão se manifestando solidárias a ele, que têm se emocionado ao receber o carinho de tantas pessoas. Abraham recebeu manifestações de apoio de pessoas, grupos e artistas de todas as regiões do país.
“Do limão, uma limonada”: A partir da forte repercussão em pouco mais de dois dias, Abraham foi convidado para uma reunião com integrantes da GAM3 e a Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre. No encontro, recebeu um pedido de desculpas e a garantia de que os artistas poderão continuar a se apresentar nas áreas públicas sob concessão. Após abordagem, a GAM3 assegurou espaço a artistas de rua. Abraham, em conversa com a associação, disse que considera que o pedido de desculpa não deve ser direcionado somente a ele, mas a todos os artistas que trabalham na rua, não só da cidade de Porto Alegre, mas de outras cidades do Estado. A arte de rua é a mais acessível, democrática, deve ser acolhida pelos gestores como um bem público a ser cuidado, acolhido, valorizado, pois é a que melhor contempla a população mais vulnerável economicamente e que não tem condições de pagar ingressos de eventos. Em entrevista ao jornal Matinal, Abraham disse que a GAM3 assegurou que dará espaço a todos os artistas de rua e que orientará melhor suas equipes de trabalho. “Assumimos o compromisso de dar suporte aos artistas de rua para poderem exercer sua arte”, diz o comunicado.
A Associação de Circo e o Sindicato defendem o que o artista acha justo: que este caso deverá ter um encaminhamento exemplar, evitando que outros artistas passem pelo mesmo constrangimento e violência de serem impedidos de exercer o seu trabalho e assim de proverem o seu sustento. Que este caso suscite o bom debate, mobilize e conscientize não somente os gestores e cidadãos de Porto Alegre, mas de todo o estado e território nacional.
O artista relembra que há também os mesmos desafios em outros municípios do interior, no litoral, por exemplo. Que esta carta possa ser assinada por mais entidades estaduais e possa chegar em todas as prefeituras e secretarias de cultura. Abrahan concorda que ações mais afirmativas da parte da GAM3 poderiam acontecer contratando artistas de rua para habitarem os espaços por ela administrados na Orla. Para a prefeitura o artista ainda sugere que se pense uma política pública que isente o pagamento de passagens de transporte em dias de apresentação, como forma de apoio à arte de rua. Em épocas de executar orçamentos como a Lei Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2 nas mais diversas instâncias (municipal, estadual e federal) é importante pensar medidas para que de fato cheguem à ponta, que estes encaminhamentos se tornem, para além de pedidos de desculpas e falas bonitas, ações concretas de promoção de visiblidade para estes atuadores, mudando a realidade injusta de constante desrespeito do poder público e de suas concessões para com estes artistas que são tão preciosos para a sociedade.
Patrícia Sacchet
Secretária Geral da Associação de Circo do RS
Consuelo Vallandro
Presidente da Associação de Circo do RS
Assinam esta carta: Conselho Municipal de Cultura de Porto Alegre (CMC), Conselho Estadual de Cultura do RS (CEC), SATED-RS.
Conheça a lei do artista de rua de Porto Alegre: https://leismunicipais.com.br/a/rs/p/porto-alegre/lei-ordinaria/2021/1283/12821/lei-ordinaria-n-12821-2021-permite-manifestacoes-culturais-religiosas-sociais-esportivas-e-de-artistas-de-rua-em-espacos-publicos-abertos-do-municipio-de-porto-alegre-revoga-a-lei-n-11586-de-5-de-marco-de-2014-e-da-outras-providencias#:~:text=2021%2C%20como%20segue%3A-,Art.,%2C%20anfiteatros%2C%20largos%20e%20vias
Notícias sobre o caso: https://www.matinaljornalismo.com.br/matinal/reportagem-matinal/concessionaria-pede-desculpa-a-artista-de-rua-apos-impedir-apresentacao/